Fonte: Revista Consultor Jurídico (CONJUR) – 14.12.2013
Por Jomar Martins
A falta de providências imediatas para atender
acidente envolvendo o próprio funcionário do hospital, dentro do seu ambiente
de trabalho, caracteriza omissão grave do empregador. Por essa razão, tem o
dever de indenizar os danos que daí decorrerem ao seu empregado — conforme
previsto nos artigos 186 e 927 do Código Civil.
Com base neste entendimento,
a 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) manteve sentença que condenou a Santa Casa de Caridade
de Uruguaiana a indenizar uma enfermeira contaminada com mercúrio, após quebra
do medidor de temperatura.
Ao invés de
ter sido submetida imediatamente a uma cirurgia de raspagem para retirar o
elemento, ela só ganhou curativo no dedo afetado. Com isso, passou a enfrentar
vários problemas de saúde, que a levaram ao afastamento e, posteriormente, à
demissão, após o fim da licença previdenciária.
A relatora do
recurso, desembargadora Laís Jaeger Nicotti, observou, no acórdão, que as
sequelas do acidente (perda de flexão no dedo, dormência no corpo, dano visual
e cicatriz pós-operatória) podem se somar a outras, no futuro. Afinal, os
efeitos do mercúrio são lentos e cumulativos.
A relatora,
entretanto, reduziu de R$ 680 mil para R$ 400 mil o valor da reparação por dano
moral, por considerá-lo mais adequado e razoável às particularidades do caso, a
fim de não gerar enriquecimento sem causa da parte lesada. O acórdão foi
lavrado na sessão do dia 20 de novembro.
O caso
O fato que deu causa à reclamatória trabalhista contra a Santa Casa de Caridade de Uruguaiana aconteceu em fevereiro de 2007, quando a autora verificava a temperatura de um paciente psiquiátrico. Agitado, o paciente acabou por cair em cima da mão esquerda da técnica de enfermagem, quebrando o termômetro. O acidente produziu um corte no dedo indicador, que foi contaminado por mercúrio.
Segundo os
autos, a técnica foi encaminhada para o pronto-socorro, onde apenas recebeu um
curativo e retornou às atividades. Dias após, quando o corte fechou, ela notou
um abcesso, sendo submetida a raio-X. O médico que a atendeu abriu o ferimento
e fez a drenagem, sem, no entanto, liberá-la do trabalho.
Decorridos 15
dias da drenagem, ela teve de se submeter à raspagem do osso da mão. Até se
afastar em definitivo pela Previdência Social, pelo período de um ano, ela
passou por oito cirurgias na mão, sem, no entanto, resgatar o movimento do dedo
indicador.
Em decorrência
da contaminação, a autora passou a sofrer de depressão e a apresentar episódios
de diarreia, tremores, dores no estômago, ansiedade, gosto de metal na boca,
sangramento nas gengivas, insônia, falhas de memória, fraqueza muscular,
nervosismo, mudanças de humor, agressividade e dificuldade em prestar atenção.
Por entender
que o empregador não garantiu sua integridade física no ambiente de trabalho e
que também não fez os procedimentos corretos quando ocorreu o acidente, pediu
reparação por danos materiais, morais e estéticos, dentre outros. Ação foi
protocolada após sua dispensa.
A
sentença
O juiz-substituto Tiago Mallmann Sulzbach, da 2ª Vara do Trabalho de Uruguaiana, após relatar o conflito de laudos e perícias pelas duas partes, escreveu na sentença que algumas certezas ficaram patentes. A primeira é de que a contaminação por mercúrio é gravíssima, pois seus efeitos no corpo são progressivos, cumulativos, com nenhum prognóstico de cura com o passar dos anos.
‘‘A tendência
é que a vida da autora seja transformada em um arremedo do que já foi e do que
poderia ter sido, em especial diante do ceifamento do que é muito caro às
mulheres, que é a sua capacidade reprodutiva, a sua capacidade de também ser
mãe’’, complementou.
A perícia
médica deixou claro, também, destacou o magistrado, que se o hospital tomasse
providências imediatas e corretas, as consequências poderiam ser
amenizadas. ‘‘Entretanto, a análise prova oral faz concluir que, muito
embora a ré tenha por objetivo o cuidado com a saúde, porque entidade
hospitalar, não foram adotadas as mais basilares medidas de prevenção e
segurança no caso da autora, não obstante a gravidade e peculiaridade do
acidente’’, observou.
Em face da
farta documentação e dos depoimentos carreados aos autos, o juiz entendeu como
comprovada a existência de nexo causal entre o acidente de trabalho e as
doenças que acometeram e acometem a técnica de enfermagem. Com isso, reconheceu
a responsabilidade do hospital — com ‘‘culpa gravíssima'' — em indenizar os
danos suportados, a teor do que prevê o inciso XXVIII do artigo 7º da
Constituição Federal.
Para reparação
moral, incluindo estéticos, o hospital foi condenado a indenizar a autora em R$
680 mil. O magistrado também deferiu a indenização por danos materiais,
consistente no ressarcimento de despesas decorrentes do acidente.
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