Fonte: Tribunal de Justiça do Piauí – 20.01.2014
Por Desembargador Brandão de Carvalho
Nosso artigo anterior tratou da responsabilidade
civil do médico em relação ao exercício da profissão em frente à ciência
jurídica no que tange a grande dificuldade na produção da prova (Clique aqui para ler). O trabalho
agora se estende no tocante a acumulabilidade do dano estético e do dano moral
dentro da seara do direito procurando quantificar o dano estético frente à
jurisprudência de nossos tribunais pátrios e estrangeiros com um breve estudo
de direito comparado.
Todos nós temos amplos conhecimentos do que se
passam nas clínicas de estéticas neste Brasil afora, sem a mínima observância
dos parâmetros da ciência médica, onde proliferam verdadeiros matadouros
humanos, aleijando-se pessoas vítimas da carnificina e do desejo incontrolado
de determinados “profissionais” em troca do vil metal fazendo vítimas fatais ou
deformidades permanentes que deixam estas pessoas incautas deformadas pela vida
inteira.
Não é atoa, que a própria Sociedade Brasileira de
Cirurgia Plástica, através da mídia televisiva, chama atenção da população para
que faça estes procedimentos somente por médicos habilitados por aquele órgão,
no sentido de defender as pessoas de profissionais incapacitados e que burlam o
Código de Ética da Medicina, as leis do país e a consciência das pessoas.
Temos assistido em programas televisivos matérias
horripilantes de jovens especialmente mulheres, que foram extorquidos por esses
maus profissionais como resultado de deformações ou desfigurações que acarretam
vergonha para a vítima, até mesmo culminando com sua rejeição no meio social em
que vivem. Estes fatos tem sido recorrentes em nosso país, principalmente nas
zonas periféricas onde atuam estas clínicas de forma absolutamente transparente
com propagandas nos grandes jornais e na própria internet vendendo às jovens
mulheres o corpo sarado, a beleza estética em todos os seus padrões de
formosura!
Tenhamos que convir que falta uma fiscalização do
próprio Estado como defensor dos direitos dos cidadãos entre eles a própria
vida como garantia constitucional, afora outros direitos e inerentes a
dignidade da pessoa humana; de outra parte, também a responsabilização dos
Conselhos Regionais de Medicina que devem está atentos diuturnamente a este
tipo de procedimento reprovável, imoral, aético e anti- jurídico.
CLAYTON REIS, “Em Danos Morais decorrentes da
Atividade Médica”, pag 247 assim se reporta:
“é no plano físico da pessoa que se concentra uma
imensa e significativa quantidade de danos morais ofensas à integridade física
das mais diversas qualidades, tais como lesões, deformidades, mortes e outras,
que ocasionam dores de ordem material que refletem no psiquismo da vítima.
Dessa forma, a atividade médica, que atua justamente na parte nobre do ser
humano, que é o seu corpo, sujeita o paciente a situações que afetam
profundamente seu equilíbrio físico e emocional.” De outra parte, o direito a
integridade física é tida por ADRIANO DE CUPIS em “Os Direitos da
Personalidade”, pg 69 como “ a par do bem da vida, modo de ser físico da
pessoa, perceptível mediante os sentidos. Este bem, por outro lado, segue na
hierarquia dos bens mais elevados, o bem da vida. De fato, enquanto este último
consiste puramente e simplesmente na existência, a integridade física,
acrescenta-lhe alguma coisa que é, preciosamente, a incolumidade física, de
importância indubitavelmente inferior ao seu pressuposto. Entendemos por dano
estético a lesão à beleza física, à harmonia das formas externas do indivíduo.
TEREZA ANCORA LOPES, em sua obra Dano Estético,
pg 17 diz que o conceito de belo é relativo. Ao apreciar-se um prejuízo
estético deve-se ter em mira a modificação sofrida pela pessoa em relação ao
que era antes. Realmente para a objetivação do dano estético, exige-se que a
lesão que enfeou determinada pessoa seja duradoura e ocasione a rejeição do
lesado no meio em que vive, caso contrário não se poderá falar em dano estético
propriamente dito, mas em lesão estética passageira, que se resolve em perdas e
danos habituais, segundo magistério de MIGUEL KFOURI NETO, em “Culpa Médica e
Ônus da Prova” Sabemos que no exercício regular da medicina danos estéticos
podem ocorrer em várias especialidades; desde um simples tratamento de pele,
aplicação de radioterapia, cirurgias reparadoras com resultado deformante,
secção de nervos com alteração da fisionomia, anestesia que ocasiona paraplegia
( raquidiana ou peridural) e muito frequentemente as cirurgias estéticas que
advêm resultados catastróficos.
Alguns autores entendem que o dano estético se
subsume ao dano moral, sendo impossível deferir se parcelas indenizatórias autônomas
para cada um desses danos, quando recaiam sobre a mesma vítima. Neste caso
existem julgamentos que exprimem este posicionamento avaliando o dano moral, o
julgador levaria em conta a repercussão estética, elevando a quantificação da
condenação. Estaria proibido o bis in idem, não se poderia
indenizar por duas vezes o mesmo fato gerador.
Entretanto, doutra parte, os estudiosos e o próprio
Superior Tribunal de Justiça, tem firmado em sua jurisprudência, a
possibilidade de cumulação dos pedidos, através de decisões dos Ministros
Sálvio, Menezes Direito, Cesar Asfor Rocha, Ari Parquendler, Rui Rosado, dentre
outros.
E Yussef observa as palavras de RODOLFO VALENÇA
HERNANDES:
“O dano estético distingue-se do moral”
O primeiro- dano estético- está voltado para fora,
vulnera o corpo, atinge, defigura a silhueta, a beleza plástica, corresponde ao
patrimônio a aparência. O segundo- dano moral- é intrínseco, está voltado para
dentro, afeta os sentimentos, macera a alma, penetra os domínios da emoção,
incorpora-se ao psiquismo, integra a essência o ser: constitui o acervo da
consciência.
AGUIAR DIAS E YUSSEF manifestaram suficientemente
suas opiniões com a possibilidade da cumulação, em regra, da indenização por
dano estético e por dano moral, chamado do psíquico, para melhor expressar o
dano representado pelo sofrimento, pela angústia, pela vergonha ou sensação de
inferioridade da vítima, atingida nos seus mais íntimos sentimentos.
Na Argentina, informa AECTOR PEDRO IRIBANE, a
discussão sobre a autonomia do dano estético parece ociosa, após a decisão da
Corte Suprema de Justiça que estabeleceu:
“ o dano estético não é autônomo, em relação
ao material ou moral, e sim integra ao outro, em ambos, segundo o caso posto.
Já o direito francês reconhece o dano estético como prejuízo autônomo. A
legislação francesa confirmou a autonomia do prejuízo estético, reparável a
título específico pela Resolução 75-7 do Comitê de Ministros do Conselho da
União Europeia.
Este segundo trabalho leva aos especialistas da
matéria ora posta, uma análise das posições convergentes ou divergentes, mas
que primam em aprofundado exame, na obrigação da indenização advindas do dano
material ou moral no contexto de nossa sistemática jurídica.
Desembargador Luiz Gonzaga Brandão de Carvalho
Decano e Presidente da Academia de Letras da
Magistratura Piauiense