Fonte: Superior Tribunal de
Justiça (STJ) – 06.03.2015
A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça
(STJ) declarou a inconstitucionalidade do preceito secundário (que estabelece a
sanção) do artigo 273, parágrafo 1º-B, inciso V, do Código Penal (CP). O tipo
trata da venda de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais de
procedência ignorada. A decisão vale para o caso analisado, mas deverá ser
aplicada pelo tribunal no julgamento de outros processos que tratem do mesmo
dispositivo legal.
A
questão foi levada ao órgão máximo do STJ pelo ministro Sebastião Reis Júnior.
Na Sexta Turma, ele é o relator de um habeas corpus que contestava a
constitucionalidade da norma. No caso, um homem foi condenado a 11 anos de
reclusão por ter em depósito para venda pequena quantidade de substâncias
anabolizantes – nove frascos e 25 comprimidos.
A
pena prevista para o crime é de dez a 15 anos de reclusão. Seguindo o voto do
relator, a Corte Especial considerou que a sanção fere os princípios
constitucionais da proporcionalidade e da razoabilidade. Trata-se de um crime
de perigo abstrato, disse o ministro, sendo evidente a falta de harmonia entre
o delito e a pena.
Sebastião
Reis Júnior citou o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello,
para quem o estado não pode legislar de forma imoderada e irresponsável, sob o
risco de gerar situações de absoluta distorção.
“Se
comparado com o crime de tráfico de drogas – notoriamente mais grave e cujo bem
jurídico também é a saúde pública –, percebe-se total falta de razoabilidade”,
avaliou o ministro do STJ. Ele classificou de “gritante” a desproporcionalidade
se comparada a pena em questão com as penas previstas para crimes gravíssimos
como homicídio doloso, lesão corporal de natureza grave, estupro, estupro de
vulnerável e extorsão mediante sequestro.
Açodada (apressada)
O
ministro disse que a Lei 9.695/98, que colocou o artigo 273 do CP no rol dos
crimes hediondos, foi aprovada de forma açodada pelo Legislativo e acabou por
considerar meras infrações administrativas como crimes graves, com pena
privativa de liberdade altíssima.
Anteriormente,
a Lei 9.677/98, chamada de Lei dos Remédios, já havia aumentado
substancialmente as penas para os delitos dos artigos 272 e 273 do CP, além de
criminalizar condutas que não representariam mais do que infração
administrativa. O ministro frisou que a Agência Nacional de Vigilância
Sanitária (Anvisa) aplica sanção de advertência para quem importa medicamento
não registrado no órgão.
Ele
observou ainda que já foi apresentada pela comissão especial de juristas que
tratou da reforma do CP nova redação para o tipo penal “inobservância de
condições e normas técnicas”. O texto aprovado prevê pena de dois a seis anos
de prisão para quem mantém em depósito insumo farmacêutico de procedência ignorada.
Ajuste
principiológico
A
pena imposta ao réu do caso julgado deverá ser redimensionada pela Sexta Turma,
considerando a sanção prevista para o delito de tráfico de drogas (artigo 33 da
Lei 11.343/06). A Corte Especial entendeu que é possível fazer a analogia por
semelhança de condutas para beneficiar o acusado.
Para
os ministros, a escolha do preceito secundário da Lei de Drogas é razoável,
pois se trata igualmente de crime hediondo, de perigo abstrato e cujo bem
jurídico tutelado é a saúde pública.
Sebastião
Reis Júnior citou precedente (REsp 915.442) em que a Sexta Turma, ao julgar caso semelhante,
decidiu promover o “ajuste principiológico” da norma, ante a
desproporcionalidade da pena. Na ocasião, os ministros aplicaram o preceito
secundário do delito de tráfico de drogas ao crime de falsificação, corrupção,
adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou
medicinais.
O Tribunal Regional Federal
da 3ª Região e o Tribunal de Justiça de Minas Gerais já declararam a
inconstitucionalidade do dispositivo em debate, mas, nessas cortes, o próprio
tipo penal foi considerado inconstitucional, o que não ocorreu no STJ, cuja
Corte Especial se ateve a fulminar o preceito secundário, ou seja, a sanção.
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